sábado, 4 de fevereiro de 2006

Mutantes imutáveis

Acabo de ler com satisfação em O Globo que a Universal Music está relançando todos os discos dos Mutantes sob seu antigo selo, PolyGram.

Eu gosto muito do som de Arnaldo Baptista, Sérgio Dias e Rita Lee, que ganharam a partir de 1969 os auxílios luxuosos de Dinho Leme (sim, o irmão de Reginaldo Leme, comentarista de automobilismo da Rede Globo) e Liminha, que tocavam respectivamente bateria e baixo.

O primeiro disco, de 1968, foi uma revolução e um achado num país massacrado pelo AI-5, onde não se podia nem respirar e os Mutantes foram uma lufada de ar fresco graças ao brilhante trabalho do maestro Rogério Duprat, que os introduziu no movimento tropicalista. Daí para gravações de músicas como "Baby", de Caetano Veloso e "Chão de Estrelas", de Orestes Barbosa e Sílvio Caldas, foi um pulo. Eles fizeram um mix bem-sucedido de puro rock'n'roll, música popular brasileira (basta ouvir o ótimo duelo rock-sertanejo de "2001" que vocês vão saber do que estou falando) e muitas outras surpresas.

Como as que perpetravam em suas performances ao vivo. Não raro, faziam apresentações fantasiados. Quando cantaram "Caminhante Noturno" na eliminatória de um Festival Internacional da Canção, da Rede Globo, Arnaldo estava vestido de gorila, Sérgio de urso e Rita Lee de noiva (dizem, aliás, que deslumbrante - e Rita era uma menina muito bonita nos anos 60).
Neste mesmo evento, eles foram banda de apoio de Caetano Veloso na anárquica "É proibido proibir" e tocaram usando roupas futuristas de plástico. A performance de Caetano e dos Mutantes foi tão chocante que eles foram vaiados furiosamente, choveram ovos e tomates no palco, o cantor baiano fez um discurso furibundo contra a platéia e a música foi desclassificada.

Aliás, a versão ao vivo de "É proibido proibir" é um achado em todos os sentidos. Consegui baixá-la via eMule e as palavras de Caetano contra a platéia insana são realmente muito, muito fortes.

Eles tinham seus próprios instrumentos fabricados pelo irmão de Arnaldo Baptista e Sérgio Dias e, mesmo com a qualidade precária das mesas de mixagem dos estúdios dos anos 60, tiraram um som fantástico de seus instrumentos nos dois primeiros discos. E inovaram ao trazer o Theremin, muita percussão, o órgão Moog (Rita Lee comprou um quando o grupo foi pra Londres e Paris) e até ao colocar aquelas bombas de mata-mosquito como instrumentos, como usado em "Le Premier Bonheur du Jour".

Não é à toa que o grupo continua cultuado, 33 anos depois do fim da fase áurea (já que eles continuaram como um grupo de rock progressivo nos anos 70, sem Arnaldo Baptista, que enveredou por trabalhos-solo). David Byrne, que redescobriu o brilhante Tom Zé, é fã incondicional, assim como Sean Lennon (autor da capa de Tecnicolor) e como era o cantor e guitarrista do Nirvana Kurt Cobain.

Agradando a gregos e baianos, os Mutantes continuam sendo referência na música brasileira. Uma prova de que ainda existe vida inteligente num mundinho cada vez mais entupido de coisas descartáveis.

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