sábado, 30 de junho de 2007

O Circo Mutante

Tinha que ser numa noite meio fria, com tempo ameaçador. Mas não dá pra esquecer tão cedo a sexta-feira, 29 de junho.

Pela primeira vez em 24 anos, desde que se instalou na Lapa, fui ao Circo Voador. Um dos últimos pólos – senão o último – da resistência cultural dos anos 80, palco de apresentações históricas de muitos dos maiores nomes de nossa música – Paralamas do Sucesso, Blitz, Plebe Rude, Titãs e Celso Blues Boy, por exemplo e também do exterior, vide Ramones.

Depois de passar uma temporada de verão no Arpoador entre 82/83, a lona foi se instalar na Lapa e por lá ficou, até a intolerância do antigo prefeito Luiz Paulo Conde, que depois de levar uma puta vaia durante um show (ora vejam...) dos Ratos de Porão, do desbocado João Gordo, simplesmente fechou o local por anos.

A prefeitura atual tratou de revitalizar o espaço, assim como já fizera com muitos espaços culturais e o Circo passou por uma boa reforma. Não tenho idéia quantas pessoas hoje podem caber ou circular lá, mas gostei do espaço, com direito a uma praça com palmeiras, e especialmente do chope bem tirado e geladinho.

Por estarmos na Lapa, o contraste do público que por lá circula em relação ao Vivo Rio, por exemplo, é bem mais latente, embora não faltassem os “coroas” de cabelo branco, alguns dos quais provavelmente os viram no FIC cantando “Caminhante Noturno”, “Ando Meio Desligado” e “Mande Um Abraço Pra Velha” e também os alternatchivos, muitos trajando coturnos e de preto dos pés à cabeça como num show de góticos e vários com as indefectíveis sandálias havaianas.

O motivo que me fez “estrear” no Circo Voador não podia ser outro: em fevereiro, eu já tinha ido ao céu, em êxtase, quando pude ver Mutantes pela primeira vez também. E ontem, voei bem alto – sem precisar da maconha que rolou livre, leve e solta. A música encarrega-se de ser o ingrediente vital nesse processo.

E confesso que não teria ido ao show, já que a grana anda curtíssima, se não fosse uma pessoa: Dinho Leme. O cara foi sensacional, aturou diversos interurbanos e de forma muito bacana, conseguiu que eu e mais três amigas pudéssemos ir ao Circo e ver Mutantes. Mais 0800, impossível.

Entramos mais de 10h30 da noite e o show começou quase no início da madrugada. Na seqüência – nenhuma novidade – começando com “Dom Quixote”, passando por “Caminhante Noturno” e seguindo pouco a pouco com as especialíssimas intervenções do idolatrado Arnaldo Baptista (o único com o nome gritado em uníssono) em “Cantor de Mambo” e “Dia 36”.

Pra mim, o repertório conhecidíssimo não surpreendeu, claro. Surpresa foi o som – muito melhor que no Vivo Rio – e as intervenções do velho de guerra Dinho na bateria. Eu, que admiro demais a técnica dos músicos que ficam atrás daquelas peças todas, bumbos, chimbaus e et cetera, segurando um parzinho de baquetas, fico cada dia mais fã do Dinho. É aquela velha história... pra quem não tocava há mais de 30 anos, é uma redescoberta e os fãs sabem reconhecer isso.

O Circo foi ao delírio no grand finale com “A Minha Menina”, “Batmacumba” – com um solo de bateria simplesmente avassalador e em “Panis et Circensis”. Ironicamente, a primeira música do primeiro disco do grupo nos anos 60 é a última que eles têm tocado.

Mas, pensando bem... quem há de se preocupar com ordem de música, quando se tem na frente da gente, diante dos nossos olhos e aos nossos ouvidos, um show maravilhoso como este?
Ah... e dessa vez não teve tietagem no camarim e nem foto com o povo do grupo. Não tive coragem de pedir mais do que consegui. Afinal, ver dois shows dos Mutantes no Rio - um deles digrátis - é privilégio de poucos.

Fim de um grande show: missão cumprida

Um comentário:

Anônimo disse...

Tá ruim de encontrar palavras para definir o retorno dessas lendas, melhor ser simples e direito:

A apertar, a beijar...
Vai caminhante
Antes do dia nascer
Vai caminhante
Antes da noite morrer
Vai
Luzes câmera
Canção que horas são
Sombra na esquina
Alguém, Maria

Sente a pulsar um amor muscoloso
Vai encontrar esta noite o amor
Sem pagar, sem falar, a sonhar

Vai caminhante...

Wallace Michel