sexta-feira, 1 de junho de 2007

Memória Le Mans - "De Cometa a Bino"

Impossível não pensar nos primórdios do nosso automobilismo sem lembrar de Christian Heins. Filho de um empresário de origem alemã e de uma italiana, carregava a seriedade germânica consigo - contudo sem esquecer da velha e boa latinidad presente pela ascendência italiana e por ter nascido no Brasil, em 1935.

Quando começou a correr em 54, aos dezenove anos de idade, Christian tinha a alcunha de "Cometa", rapidamente substituída por "Bambino" (garoto em italiano) e depois virou somente "Bino", apelido pelo qual é conhecido no automobilismo.

Em 1956, ele disputou a primeira edição das Mil Milhas com um Volkswagen alemão, dotado de componentes Porsche e preparado pelo mago Jorge Lettry. Em companhia de Eugênio Martins, "Bino" chegou em segundo, enfrentando as lendárias Carreteras gaúchas de quase 300 HP de potência.

Pelos três anos seguintes, estagiou na Europa e correu em provas de Subida de Montanha, como a Bolzano-Mendola. Em 59, foi segundo colocado atrás de Fritz d'Orey numa corrida de Fórmula Júnior em Messina. No ano seguinte, vítima de transtornos para recuperar troféus ganhos na Europa, foi agraciado com o seguinte elogio por ninguém menos que JK, o presidente da república: "Christian é um monumento nacional". Com um padrinho como esse, quem haveria de morrer pagão...

Em 60, definitivamente de volta ao país, assinou com a Vemag para correr as Mil Milhas pela equipe da revenda Serva Ribeiro. Porém, desentendeu-se com o chefe da equipe e foi embora. Em seu lugar entrou Bird Clemente e Christian conseguiu uma vaga na equipe FNM-JK, correndo com ninguém menos que Chico Landi - e ambos venceram a corrida.

"Bino" foi então chamado por William Max Pearce, presidente da Willys Overland, para ser o diretor da divisão de carros esporte da marca, que importaria os Alpine A-108 preparados por Jean Redelé. Por sugestão do publicitário Mauro Salles, os carros foram rebatizados de Interlagos e o modelo foi apresentado com muito sucesso no Salão do Automóvel em outubro de 1961.
Em 62, foi promovido a gerente do departamento de competições, além de piloto da marca. Nessa época, a Willys revelou gente do naipe de Wilson Fittipaldi Jr., Carol Figueiredo, Luiz Pereira Bueno e Rodolfo "Fofo" Olival Costa.

Há inclusive uma passagem narrada por Jan Balder em seu livro História do Automobilismo Brasileiro em que "Bino" chegou no autódromo de Interlagos durante um teste das Berlinetas Alpine e baixou o recorde da volta, registrado por Wilson Fittipaldi, em cinco segundos. E isso trajando camisa social com mangas e calça comprida, usando apenas capacete e luvas próprias para competição.

Sua capacidade inquestionável como chefe de equipe e piloto o levou a ser convidado pela Alpine para integrar a equipe francesa nas 24 Horas de Le Mans de 1963. Com um modelo praticamente semelhante ao Interlagos - o M63, inscrito na categoria protótipo, ele correria em dupla com Jose Rosinski.

Nos treinos, ele foi oito segundos mais veloz que o companheiro de equipe. E durante a corrida, "Bino" vinha em terceiro na geral e liderando na categoria específica para carros entre 700 e 1000 centímetros cúbicos de cilindrada. Com mais ou menos 5h20 min de prova, o Aston Martin de Innes Ireland e Bruce McLaren lavou a pista de óleo. O asfalto escorregadio traiu três competidores, que derraparam e bateram. Sem saber da armadilha, Christian vinha pisando fundo, quando perdeu o controle do M63, bateu no René-Bonnet de Jean-Robert Manzon e depois num poste de luz, incendiando o carro em seguida.


O Alpine M63 carbonizado

A pancada que sofreu na cabeça, além do fogo que consumiu o Alpine foram fatais: aos 28 anos de idade, Christian Heins estava morto. Imaginem o quão duro deve ter sido para a esposa de "Bino", Maria Waltraud e para o pai, Carl Heinricht Heins, receberem a notícia de seu passamento ainda em plena pista, enquanto assistiam calmamente à corrida.

A morte de "Bino" foi a maior tragédia do automobilismo brasileiro antes dos desaparecimentos precoces de José Carlos Pace e Ayrton Senna. E para mostrar o quão ele era importante no seio da equipe Willys, Luiz Antônio Greco batizou, anos mais tarde, o projeto que Toni Bianco fez para o fabricante, de "Bino" - que nas mãos hábeis de Luiz Pereira Bueno conquistou vitórias que com certeza encheram Christian Heins, mesmo lá no andar de cima, de orgulho.

2 comentários:

Anônimo disse...

Bino Heins é figura recorrente nos nossos farnéis da SuperClassic. Quem o viu correr afirma que foi um dos maiores - se não o maior da sua geração - pilotos brasileiros.Técnica refinada, grande capacidade de acerto e domínio incomparável do carro, eram as suas principais características. Mas aquele maio de 63 acabou com todas as nossas esperanças.

Dinho Amaral disse...

não podemos esquecer que o Wilsinho homenageou o filho com o nome dele...Christian Fitipaldi....