Dezessete de outubro de 1982. Há mais de 25 anos, portanto, no circuito gaúcho de Tarumã (sempre esse autódromo pioneiro!), realizou-se a primeira de duas corridas experimentais do Campeonato Sul-Americano de Fórmula 2. Com 30 mil presentes nas arquibancadas e em volta do traçado e 23 competidores na pista, Alberto Scarazzini largou na pole position e o vencedor naquela ocasião foi Miguel Angel Guerra - que um ano antes estava na Fórmula 1 com a escuderia italiana Osella.
Os brasileiros participaram com os mesmíssimos carros que disputavam a F-2 daqui, derivada da Supervê extinta em 1980 e com motores movidos a álcool. Treze deles alinharam: Pedro Muffato, Ronaldo Ely, Chico Feoli, Adú Celso, Leonel Friedrich, Cézar Bocão Pegoraro, Aroldo Bauermann, Victor Marrese e Josué de Melo Pimenta, estes com o modelo Muffatão e motor Passat; Dárcio dos Santos, com Heve Passat; Mauro Fauza e Arthur Bragantini com os antediluvianos Polar Volkswagen.
Vieram dez outros pilotos de três países sul-americanos, todos usando o modelo Berta (do qual foi derivado o Muffatão), com motores Dodge 1500 ou Renault - os argentinos Alberto Scarazzini, Miguel Angel Guerra, Guillermo Maldonado, Guillermo Kissling, Juan Fangio II - sobrinho do mito Juan Manuel Fangio, Luiz Rúben di Palma - grande rival de Luizinho Pereira Bueno no Torneio Sudam de Protótipos, com o lendário Berta Tornado - e Gustavo Sommi; os uruguaios Egon Einoder e José Pedro Passadore; e o chileno Santander.
Ainda nesse mesmo ano houve uma prova em Buenos Aires, na qual - se me lembro bem - veio o estadunidense Bobby Rahal, que já era uma estrela da CART, e Arthur Bragantini, até quebrar, brilhou com um monoposto cedido por Miguel de Guidi, que junto com Oreste Berta era um dos maiores preparadores do automobilismo argentino na época.
Em 1983, mesmo com toda a disparidade técnica entre os monopostos deles e os nossos, organizou-se um Campeonato Sul-Americano que teve situações interessantíssimas, como um treino em Interlagos sob chuva onde os brasileiros (de pneu Pirelli) deitaram e rolaram em cima dos gringos, calçados com pneus Fliter - de qualidade inferior. Mas na corrida, com pista seca, não deu outra: vitória de um piloto argentino (não me lembro qual), embora Marcos Troncon, com um Heve, tenha dado muito trabalho.
No ano seguinte, com os grids minguando, a F-2 Brasil chegou ao fim e o sul-americano persistiu pelos anos seguintes com Guillermo Maldonado levando todas as taças de campeão. As únicas vitórias de pilotos brasileiros nesse período até 1986 foram de Raul Boesel (em Jacarepaguá e com equipamento argentino) e Leonel Friedrich, este sim correndo com o Muffatão Passat e levando a torcida em Tarumã ao delírio.
Lembro bem também das fotos que vi na Auto Esporte do acidente monumental do Marcos Troncon em Punta del Este, no Uruguai, onde ele arrebentou seu Heve numa casa. Acredito que isto tenha sido em 1985 e quem era casada com ele nesta época é uma colega de profissão: Monika Leitão, que trabalha na produção do Esporte Espetacular.
Em 87, veio a tentativa de equiparação com o que acontecia de mais moderno no mundo, e surgiu então a Fórmula 3 sul-americana. Entre dezenas de modelos Berta, todos já com mecânica importada, vieram um Dallara - trazido por Gustavo Sommi e um Reynard - com a equipe Ge.Mo.Uruguaya, com José Pedro Passadore. A primeira prova foi ganha por Leonel Friedrich, com um Berta da equipe de Mario Biagini. O pelado (calvo), como o piloto gaúcho era conhecido, levou o título na raça, na garra, numa etapa dramática em Córdoba, num circuito de rua.
Depois disto, as decisões polêmicas de título foram uma constante: Juan Giacchino (88), Gabriel Furlán (89), Christian Fittipaldi (90) e principalmente Fernando Croceri (93) tiveram suas conquistas manchadas por escândalos e manobras de bastidores onde em sua grande maioria os argentinos tiveram sua parcela de culpa.
Apesar disto, a categoria teve uma incrível vocação para revelar bons pilotos, mesmo misturados a veteranos como Pedro Muffato, que correu nela até os 54 anos.
Jaime Melo Jr., Ricardo Zonta, Hélio Castroneves, Max Wilson, Cristiano da Matta, Vítor Meira, Bruno Junqueira, Duda Pamplona, Lucas di Grassi, os gêmeos Ricardo e Rodrigo Sperafico, Thiago Medeiros, Nelson Ângelo Piquet, entre tantos outros, formaram uma geração que conquistou títulos e vitórias no automobilismo internacional.
Hoje a F-3 está à míngua como a única alternativa de monoposto não só no Brasil como em todo o continente, num certame que desde o ano passado só conta com a presença de equipes brasileiras. O último piloto argentino a correr lá foi Pablo Pérez, que ao tentar a sorte este ano na Indy Pro Series, sofreu um mega acidente em Homestead e não se sabe sequer se voltará ao automobilismo.
O mais recente campeão, Clemente de Faria Jr., pretende iniciar carreira na Europa, para onde migrou o baiano Luiz Razia, o melhor do campeonato do ano passado.
11 comentários:
Lembro um caso na F-3 Sudamericana em que o Helinho Castro-Neves estava ganhando a última corrida e o segundo no campeonato (argentino)estava mal posicionado na corrida. O argentino necessitava de um segundo lugar para levar o campeonato e, todos os outros carros pararam na última volta para ele chegar em segundo... Marmelada pouca é bobagem!!!
Ludimar Menezes
Ludimar, esse escândalo é o título do Fernando Croceri, que era quinto colocado na prova e um a um os pilotos que vinham na frente dele acintosamente pararam ou reduziram seu ritmo: Guillermo Kissling, Fabián Malta e Gabriel Furlán, sendo que só o Furlán tinha patrocínio da YPF, o mesmo do Croceri. Os outros dois fizeram de puro mau-caratismo mesmo.
Rodrigo,
Bela lembrança e belo post!! Parabéns!!
Pô Mattar !
Cadê as fotos!?
O Heve do Troncon foi o F2 mais bonito que surgiu naqueles tempos,teve também um Muffatão modificado pelo Gigante ,a pintura era igual a Ligier-Talbot de 81 .
Imagina só para quem o Caique torcia.
Jonny'O
na epoca da corrida de buenos aires(que a band transmitiu ao vivo) o luciano do valle comentou no ar que o boby rahal estaria de ferias na argentina e ao saber da corrida teria resolvido alugar o carro para correr. ele esteve sim na prova, mas se a versão do luciano era a correta, isto não sei dizer.
Como sempre brilhante...
Esse seu post mostra porquê a categoria ainda tem seu charme. Infelizmente não temos investimentos em uma categoria intermediária para que garotos cheguem melhor formados nela.
Já passou da hora também da categoria passar a se chamar F3-Brasil, afinal de contas o maior charme do título Sulamericano é competir contra pilotos de outros países.
E uma tristeza: Este final de semana eu ouvi de um chefe de equipe da Stock Car (que te falo depois em off quem é) que daqui pra frente automobilismo no Brasil é só turismo, Fórmula acabou!!!
Chato... principalmente se analisarmos que isso acontece devido a pensamentos como esse.
Mattar,
A F2 Sulamericana foi o período de transição até aqui aportar a F3 idem. Não há como negar a superioridade dos argentinos nesta categoria pois já há alguns anos vinham desenvolvendo chassis e motores - A F2 argentina remonta ao início dos anos 70, creio, embora com outra configuração. Mais ainda, em termos de pilotos o Brasil passava por um período de transição de gerações, com suas grandes estrelas todas na Europa, então a grande Meca do automobilismo mundial, enquanto os argentinos ainda dispunham de seus grandes nomes da categoria.É só conferir a lista de participantes e com exceção de um ou dois nomes brasileiros realmente competitivos, o resto ainda estava no período da grande aprendizagem.
Jonny'O, você que é um arquivo, providencie as fotos pra nós, pô... pra quem conseguiu a do Cianciaruso, pode achar qualquer uma outra da F-2!
Egídio, em 1982 o Luciano ainda não era da Band, ele tava na Record e só mudou pra emissora dos Saad em 1983.
OK!
Aguarde!
Jonny'O
Mattar, realmente o Bobby Rahal disputou a prova de F2 em Buenos Aires no final de 1982. Ficou em quarto ou sexto... Tenho uma Corsa argentina com a cobertura dessa corrida. Vou procurá-la.
Outro que deu as caras na F2 Sudam foi Alex Caffi, que correu em Punta del Este em 1984 ou 1985. Não sei como ele foi.
Uma coisa que para mim sempre foi incompreensível era essa história de brasileiros correrem com motores a álcool e argentinos com motores a gasolina. Em 1982, o Brasil ainda estava sob proibição do uso de gasolina em competições automobilísticas (ela só seria revogada em 1986). Mas isso valia somente para competições NACIONAIS. Competições INTERNACIONAIS não estavam sujeitas a essa regra (é claro: a Fórmula 1 não corria a álcool no Brasil, nem o Mundial de Rali...). E parece que ninguém se lembrou disso... O resultado é que nossos bravos preparadores e pilotos passaram anos levando altos "vareios" dos argentinos, cujos motores a gasolina eram muito mais eficientes que os nossos a álcool.
Abraços. (LAP)
LAP,
Acho que e a questão "álcool x gasolina" explica-se pelo custo. No Brasil ainda corria-se o Brasileiro de F2 com álcool enquanto no "Mercosul", a gasolina. Creio que os preparadores brasileiros optaram por somente um tipo de preparação apenas para redeução de custos. Se bem que o álcool permitia uma taxa de compressão maior dos motores, mas não sei qual a octanagem da gasolina usada pelos argentinos, o que poderia ser facilmente contraposto por uma nafta de maior octanas.Além disso, los hermanos já lidavam com a F-2 desde o início dos anos 70, com um parque maior de preparadores, motores, etc.
Grande abraço
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