terça-feira, 5 de dezembro de 2006

Um século de glórias em grená e branco

No último fim de semana, exatamente no domingo, comemorou-se o centenário de um dos clubes mais queridos do futebol italiano: o Torino.

Tenho grande simpatia por esta agremiação, primeiro porque o uniforme é de uma cor que acho linda - o grená; segundo e principalmente pelo fato de ser o arqui-rival da Juventus, o clube mais prepotente do calcio, sempre acima do bem e do mal.

O Torino nasceu numa cervejaria, fundado por dissidentes da Juve e integrantes do FC Torinese. Mas a primeira taça demorou a vir: foi na temporada 27/28.

Na época da II Grande Guerra, o clube de Turim era considerado um dos mais fortes da Europa. Não por acaso, num período sem Copa do Mundo, faturou os mais importantes títulos do país: o Campeonato Italiano e a Copa da Itália.

Em 1946, a Squadra Granata era praticamente imbatível e a base da seleção italiana, com nada menos que 13 jogadores do time na lista de convocados - entre eles o cracaço Valentino Mazzola, o grande jogador da Itália na época. Este time, na temporada 47/48, ganhou mais uma vez o título italiano, com recorde de pontos (65, dezesseis à frente do segundo colocado), de gols marcados (125), média de gols (3,78 - a maior até hoje) e de goleadas, dentro e fora de casa.

A escalação, todo mundo sabia de cor: Bacciagalupo; Ballarin e Maroso; Martelli, Rigamonti e Castigliano; Menti, Loik, Gabetto, Mazzola e Ossola.

Mas esta mesma equipe seria vítima de uma das maiores tragédias do esporte.

Em quatro de maio de 1949, retornando de Lisboa após um amistoso com o Benfica (derrota por 4 x 3), a delegação do Torino foi surpreendida com o choque da aeronave que os transportava contra a Basílica de Superga.

Reprodução do jornal "La Domenica del Corriere" com a cobertura da tragédia de Superga


Alguns de seus jogadores, aliás, foram homenageados post mortem com seus nomes batizando estádios de futebol país afora: Mario Rigamonti, no campo do Brescia. E Romeo Menti, ao do Vicenza.

Todos os membros da comissão técnica, dirigentes e jogadores morreram, causando comoção em toda a Itália. Meio milhão de pessoas compareceu ao funeral dos jogadores. E o Torino, com um time de juvenis, disputou as quatro partidas restantes - vencendo todas contra Genoa, Palermo, Sampdoria e Fiorentina, respectivamente. Desse modo, conquistaram o título, ressurgindo das cinzas.

A última conquista nacional aconteceu na temporada 1975/1976, de novo com uma equipe que possuía em seu plantel excelentes jogadores, como o goleiro Bordon, o meio-campo Cláudio Sala e os atacantes Pullici e Graziani, os "gêmeos do gol" na equipe comandada pelo já falecido Gigi Radice.

Quando os jogos do Campeonato Italiano passaram com mais freqüência no Brasil (e eu me recordo vagamente de ter visto a final da temporada 76/77, ganha pela Internazionale), ficamos mais íntimos dos craques locais, do "futebolês" falado por lá e também vimos o êxodo de grandes craques.

O lateral Júnior, então no Flamengo, deixou o Brasil em 1984 e foi para lá. Imediatamente ganhou a camisa 5, a liderança do meio-campo e conquistou a torcida com seu futebol técnico e sua disposição. Idolatrado e apelidado de Liovigildo ou de Leo-Junior, ele não conquistou títulos, mas deixou saudades.

Leo-Junior em ação: ginga brasileira e 'grinta' italiana


Como também o atacante Walter Casagrande, que esteve por lá no início da década de 90, ajudando o Toro a conquistar uma vaga na final da Copa da UEFA, talvez a última grande competição que o clube disputou. O Torino perdeu o título para o Ajax pelo critério de desempate dos gols pró fora de casa, uma vez que a decisão terminou empatada em 2 x 2 no Delle Alpi.

Em 1993, o último troféu relevante: a Copa da Itália, ganha com goleada de 5 x 2 sobre a Roma. Mas o encanto se esvaiu. O clube contraiu dívidas monstruosas e seguidos rebaixamentos à Segunda Divisão. Virou o que se chama de "Ioiô".

Na temporada 2004/2005, o então técnico Ezio Rossi conseguiu o que parecia impossível: trazer o Torino novamente à divisão de elite. Mas depois de uma análise da situação financeira do clube, a FIGC (Federazione Italiana Gioco Calcio) vetou a subida do clube, que posteriomente faliu.

Com a razão social mudada para Torino FC, o clube renasceu no último campeonato. Urbano Cairo, o novo presidente, trabalha com pés no chão e a persistência rendeu frutos. Após um comemoradíssimo empate com o Mantova, o Torino, o velho Toro estava de volta à Série A, sem sustos.

Na atual temporada, mesmo com um elenco experiente onde despontam Abbiati (ex-Juventus e Milan), Pancaro (ex-Lazio e Milan), Muzzi (ex-Lazio), entre outros, o Torino levou algumas bordoadas feias, caindo de quatro em casa para a Lazio e levando três do Palermo.

Mas a torcida, apaixonada como nunca, está em estado de graça. De repente, o time emplacou três vitórias seguidas e a última, no dia do Centenário, é comemorada até agora. O gol de Comotto provocou uma explosão grená no Delle Alpi que, vamos e venhamos, nenhum outro clube da Itália (vá lá, talvez o Nápoli, se voltar para a Série A) seja capaz de proporcionar hoje.

A linda festa da torcida granata no último domingo

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